Este artigo tentará trazer subsídios para o leitor comparar e tirar suas conclusões entre a competição no setor de bebidas entre a Ambev e a Heineken.
Foram analisados e comparados diretamente os demonstrativos contábeis das duas empresas envolvidas referentes ao encerramento do ano de 2019. Estes demonstrativos analisados são os consolidados, ou seja, envolvem todas as unidades globais, de todos os países. Assim fica mais justa a comparação visto que a Heineken está em vários países e tem o Brasil como uma das suas maiores forças, enquanto a Ambev tem presença em vários países e tem no Brasil sua maior força também.
Os dados podem ser obtidos diretamente das fontes: AMBEV e HEINEKEN.
Estes dados foram comparados por meio de indicadores, sem envolvimentos diretos de moedas. Afinal é para isso que usamos a análise fundamentalista quantitativa. A análise da parte qualitativa eu deixo com cada investidor.
Vamos diretamente aos dados em forma de tabela e logo depois realizarei breves comentários.
O primeiro item analisado foi o aumento da Receita Líquida entre 2019 e 2018. Neste quesito a Heineken foi melhor em termos percentuais.
O EBITDA é o fator fundamentalista de comparação entre empresas a nível mundial. Ele pode ser utilizado para comparar empresas do mesmo setor do mundo inteiro. Se quiser saber um pouco mais sobre ele, já escrevi algo AQUI.
Se compararmos o aumento de EBITDA entre 2019 e 2018, a Heineken teve 15% de aumento enquanto a Ambev teve 2% de retração. Isto significa que a Heineken teve um ganho operacional muito expressivo. Para ter esse aumento, com certeza ela cortou custos e despesas operacionais.
A Ambev, ao contrário, inclusive soltou um fato relevante dizendo que seu 1º Trimestre de 2020 tem uma previsão de queda de 17%-20% em seu EBITDA. Também explicou em seu Press Release (no link das demonstrações que coloquei no início) na página 7, que esta redução no EBITDA se dará por uma maior despesa com marketing, vendas e uma maior pressão nos custos.
Também deixa claro que a empresa pretende retomar seus níveis normais de EBITDA no decorrer do ano de 2020. A leitura das entrelinhas que faço é que a empresa vai investir pesado em marketing e maior pressão nas vendas para fazer frente à Heineken.
Apesar da diferença entre 2019 e 2018 no EBITDA podemos verificar que a Margem EBITDA da Ambev continua imbatível com 40% contra 24% da Heineken. Esta margem corresponde, basicamente, ao seu lucro resultante das suas atividades operacionais.
Agora podemos já perceber porque a Ambev está tranquila em reduzir 17% de seu EBITDA. Com esse número ela praticamente empata com o número da Heineken e consegue forçar um aumento de market share.
O aumento de Lucro Líquido entre 2018 e 2019 da Ambev foi mais modesto em relação à Heineken. Mesmo assim, aumentar 7% no lucro em um ano é uma taxa muito boa.
A Margem Líquida da Ambev também não deixa a desejar. É maior 2,3 vezes do que a da Heineken. Isto significa que após todo o processo evolutivo da suas operações, pagamentos de dívidas com terceiros e impostos ao governo, a Ambev ainda consegue reter quase 1/4 de suas receitas de vendas enquanto a Heineken somente consegue reter 1 décimo destas vendas.
O Grau de Alavancagem Total aqui utilizado tem um significado. Tentei ver se o aumento de receita tem um impacto muito grande em seu lucro líquido. Com certeza esse impacto é maior que a Ambev, cerca de 25% maior. Isto significa que o incremento de 1% nas receitas da Heineken faz ela produzir um lucro de 1,94x maior enquanto a Ambev aumenta apenas 1,57x seu lucro. A Ambev tem um ritmo mais lento, talvez pelo seu tamanho.
A Liquidez Corrente relaciona a capacidade de pagamento de curto prazo com os recursos de curto prazo (AC/PC). Uma relação acima de 1 é ideal. Nesse quesito a Ambev se destaca tendo em seu Ativo Circulante recursos suficientes para pagar suas obrigações de curto prazo. A Heineken neste quesito deixa bastante a desejar.
O ROE (Retorno sobre PL) da Ambev é um pouco superior que o da Heineken.
O aumento de PL foi praticamente o mesmo para ambas empresas.
As dívidas são um destaque na diferença das duas empresas. Veja que a Ambev praticamente não tem dívida. Nota dez nos três indicadores (veja maiores detalhes sobre endividamento de empresas AQUI).
Já a Heineken está bem endividada com seu indicador DB/PL no limite de 1 e DL/EBITDA acima de 2. Entretanto, seu ICJ (EBITDA/Juros sobre Empréstimos) está confortável demonstrando o bom controle pela empresa neste momento.
Entendo que a Heineken está se capitalizando e alavancando para aumentar sua presença mundial. Ela tem muito espaço a ganhar ainda frente às suas concorrentes.
O Caixa Operacional (FCO) da Ambev ficou praticamente estável entre 2018 e 2019 enquanto que o FCO da Heineken reduziu ligeiramente. Veja que mesmo tendo receitas bem maiores em 2019 o caixa das empresas não aumentou no mesmo ritmo, apenas se manteve estável.
Os investimentos em imobilizado e intangível (CAPEX) das duas empresas em relação à depreciação/amortização foi bem semelhante, empate técnico. Aqui nota-se que as duas empresas repuseram seu maquinário e ainda investiram um pouco mais (7%/8%). O ideal é que a empresa sempre reinvista o equivalente à sua depreciação para manter seu parque industrial não-obsoleto.
Se o indicador CAPEX/D&A é maior que 100%, já é um bom sinal. Daí quanto menor o percentual do CAPEX/FCO, melhor. A interpretação é fácil: já tendo investido o necessário em CAPEX, quanto vai sobrar do Caixa Operacional para os terceiros (pagamento de dívidas), os acionistas (dividendos) e para capital de giro?
A resposta é o indicador CAPEX/FCO – 100%. A Ambev tem 72% do seu Caixa Operacional livre de investimentos para aplicar enquanto a Heineken tem apenas 52%.
O indicador FCO/RL indica a força da geração de caixa da empresa. Ele verifica quanto de cada real de venda foi transformado efetivamente em caixa ao final de todo o período. A literatura relata que 10% é um bom indicador. Na comparação entre as duas empresas fica claro a superioridade da Ambev neste quesito. Afinal, a empresa não sobrevive de lucro contábil, mas de geração efetiva de caixa.
O indicador FCL Capex/LL eu gosto bastante (já falei sobre ele AQUI). Por ele consigo ver o quanto sobrou de caixa depois dos investimentos e está acima do lucro líquido da empresa. Se a Ambev quiser distribuir 100% de seu lucro líquido, ela tem caixa para isso, enquanto a Heineken tem ligeiramente menos liberdade para esta distribuição.
A título de bônus, a Ambeu distribuiu 67% de seu lucro como dividendos enquanto a pagou 51%.
Por fim, analiso o saldo final em caixa contra o EBITDA. Quero saber se a empresa tem caixa suficiente pra cobrir os custos futuros e usar como capital de giro de maneira folgada. Veja que a Ambev tem bastante recurso em caixa enquanto o caixa da Heineken anda bem apertado. Por este indicador percebemos porque a Heineken vem se endividando (para ter dinheiro para pagar suas obrigações, pois tem caixa baixo) e porque a Ambev tem caixa alto (não tem dívida e acumulou caixa durante anos para ter essa folga agora – ela fez buy & hold do seu caixa, rsrsrs).
CONCLUSÃO
Esta análise foi ampla, complexa e demorada. Provavelmente muitos conceitos foram jogados e o leitor iniciante ficará perdido. Entretanto, neste Blog tem muito material para estudar e ampliar o conhecimento fazendo com que uma leitura posterior deste artigo seja mais palatável.
Um investidor iniciante pode tomar como base esta análise, principalmente dos indicadores, e tentar aprender sobre eles neste Blog, e depois aplicar sozinho na análise de outras empresas. Faça isso! Desenvolva! Aprenda! Coloque nos comentários as dúvidas que vou produzindo mais conteúdo para vocês.
Gosto sempre de relembrar, ao final de cada postagem, que a ação aqui divulgada não é recomendação de compra. Ela faz parte de um Método Didático de escolha de ações e Planejamento de Investimento visando a construção de uma Carteira Previdenciária.
Cada investidor deve se apropriar do conhecimento em si e aplicá-lo à sua própria estratégia que será definida e aperfeiçoada ao longo de sua caminhada financeira durante a vida inteira.
Abraço e até a próxima publicação!
Interessante análise, várias indicadores pouco conhecidos, eu mesmo praticamente não utilizo tantos pra meus estudos, mas bem legal! Parabéns!
https://bilionariodozero.blogspot.com/
Ae amigo! Os indicadores são todos automatizados já por causa da inserção manual do balanço a cada trimestre. Só insiro alguns dados básicos dos demonstrativos e já sai tudo pronto. Mas somente alguns deles já dá pra fazer uma boa análise das ações. Agora eu precisava ver se essa Heineken ia dar trabalho pra Ambev ou não, rs!